Belém – Conjunto Arquitetônico e Paisagístico do Instituto Gentil Bittencourt


Imagem: Celso Abreu

O Conjunto Arquitetônico e Paisagístico do Instituto Gentil Bittencourt, em Belém, foi tombado pelo Departamento de Patrimônio do Estado do Pará.

Governo do Estado do Pará
DPHAC – Departamento de Patrimônio Histórico Artístico e Cultural
Nome Atribuído: Conjunto Arquitetônico / Paisagístico do Instituto Gentil Bittencourt (Edifício, Jardins e Grade)
Localização: Av. Magalhães Barata, n° 137 – Nazaré – Belém-PA
Data de Tombamento: 01/11/1982

Descrição: O final do século XIX, pleno apogeu do chamado ciclo da borracha na Amazônia, é o momento da criação do Instituto Gentil Bittencourt, em Belém do Pará, substituindo o antigo Colégio Nossa Senhora do Amparo, criado em 1804, por iniciativa do bispo D. Manoel de Almeida Carvalho, para o atendimento de meninas desvalidas.
É o momento também em que entre os muitos debates na sociedade civil e política no Brasil, um em especial, o dos médico-higienistas, propunha campanhas para “sanear o país”, através de projetos de higienização. Esses, conjugados aos projetos de urbanização das cidades brasileiras, postulavam mudanças no campo da saúde e da medicina, vislumbrando a criação de uma nação moderna com indivíduos saudáveis e livres de vícios, pelo uso de boas práticas higiênicas. Em Belém do Pará, tais ideias encontram eco nos meios políticos e intelectuais, quando essa visão saneadora vai se transformar na proposição de projetos de organização do espaço urbano, que inclui o embelezamento da cidade, aproveitando-se dos amplos excedentes econômicos gerados pela produção e exportação da borracha. Entre as medidas tomadas para concretizar esses objetivos, estão: o combate às epidemias; a reforma do serviço sanitário; o saneamento básico; e a regularização do abastecimento de água encanada. A isso irão se juntar a construção de prédios públicos, pensados e projetados tendo em vista tal concepção saneadora da cidade, atendendo também aos valores estéticos correntes à época.
É assim que, em 1893, através da Lei nº 86, de 25 de fevereiro, no governo de Lauro Sodré, o Congresso aprova recursos para a construção de um novo edifício para o Colégio do Amparo, “escolhendo para isso o melhor local, de maneira a preencher todas as condições higiênicas dos internatos e a comportar até trezentas alunas, distribuídas proporcionalmente pelos municípios, afora o acolhimento dos corpos docente e dirigente”.
A responsabilidade pela elaboração da planta de um novo prédio é entregue ao engenheiro civil Victor Maria da Silva, vinculado à Secretaria de Obras Públicas.
O terreno escolhido para a construção do novo prédio tem grandes dimensões, localizado numa parte nobre da cidade, onde até então funcionava o Instituto Paraense de Educandos e Artífices. A solenidade de lançamento da sua pedra fundamental aconteceu em 21 de abril de 1894, com a presença de figuras ilustres dos meios políticos, religiosos, intelectuais e militares.
As obras, entretanto, acarretaram grandes gastos aos cofres públicos, o que ocasionou sua paralisação no governo seguinte, de Paes de Carvalho, só tendo sido retomada posteriormente, no governo de Augusto Montenegro.
Ainda no governo de Paes de Carvalho, outra medida importante, logo no seu início, em 1897, foi a mudança da denominação de colégio Nossa Senhora do Amparo para Instituto Gentil Bittencourt, em homenagem ao Dr. Gentil Augusto de Moraes Bittencourt. No mesmo ano, através do decreto nº 448, de 06 de julho, o já então Instituto foi reorganizado, estabelecendo-se como sua finalidade dar instrução primária e educação moral e doméstica às órfãs desvalidas. Foi definido ainda que a sua administração ficaria sob a responsabilidade de um diretor, com auxílio de seis membros de um conselho, além de uma regente que seria responsável pela administração interna.

Na virada do século, em 1901, já no governo de Augusto Montenegro, a preocupação em retomar as obras do Instituto Gentil Bittencourt, paralisadas no governo anterior, é demonstrada na mensagem apresentada ao Congresso no início da sua gestão:
Destinado á educação de orphãs desvalidas o Instituto “Gentil Bittencourt” continúa a merecer da parte do governo a mesma attenção com que sempre foi olhado, em respeito ao humanitario fim da instituição […] Era meu desejo realizar alguns melhoramentos que considero necessários para completar o plano de educação que ahi se de dar, pondo-a mais de harmonia com o que rigorosamente deve conhecer uma boa dona de casa, qualquer que seja a sua posição social, e muito especialmente a filha do povo na sua complexa missão de auxiliar o marido, ajudando-o, animando-o na lucta pela vida, cuidando da educação dos filhos, tratando, enfim, da economia doméstica.
Augusto Montenegro deu continuidade às obras no seu segundo mandato. A prioridade dada à instituição era evidente e se evidenciava nos relatórios do governo, nos quais se identifica a constante preocupação em registrar os gastos e os avanços nas obras.
A edificação do Gentil teve um custo altíssimo para a época que, segundo Vianna, se calcula tenha ultrapassado o valor de 1.300:000$000 réis. Mas, por outro lado, o autor registra a imponência e a importante localização do prédio:
O Instituto Gentil Bittencourt acha-se majestosamente colocado entre as duas mais belas avenidas desta capital, a Independência e a S. Jerônimo, completamente fechado por um muro de quatro metros de altura, que o separa, à esquerda, de prédios particulares, e à direita, dos imóveis pertencentes à companhia “Pará Electric”. O terreno ocupa uma área de 20393 metros quadrados. A sua posição é, pois, a mais desejável para um estabelecimento desta natureza: não está no centro nem fora da cidade, mas num dos bairros mais aristocráticos e higiênicos, sendo facilmente servido pelas duas espaçosas avenidas e por todos os bondes que, partindo da companhia já mencionada, seguem para os mais longínquos pontos da cidade de Belém.

A edificação finalizada por Montenegro estava de acordo com a suntuosidade de outras inauguradas nesse período, que coincide com a intendência de Antonio Lemos na administração da cidade e como parceiro do governador na missão de imprimir nela o padrão de beleza e civilidade tão almejado pelas elites da época. Em vários documentos foram registrados os avanços alcançados com o novo prédio, solucionando problemas existentes na instituição, desde o primeiro espaço criado pelo bispo D. Manoel, no início do século XIX.
Com a aproximação do fim das obras, Montenegro indica, na mensagem de 07 de setembro de 1905, a necessidade de o instituto passar por uma reforma radical, que incluía as partes administrativa e técnica.
Em linhas gerais, Montenegro expõe aos integrantes do Congresso a sua intenção de entregar a administração interna do instituto a uma ordem religiosa, estabelecendo um contrato com o estado. O instituto continuaria vinculado ao estado e as aulas seriam ministradas pelo corpo de professores do ensino público, enquanto a parte do ensino referente às prendas domésticas seria da responsabilidade da ordem religiosa. A administração superior da instituição deveria ser subordinada ao secretário da Instrução Pública. A autorização é dada pelo Congresso do estado, através da Lei nº 946, de 9 de outubro de 1905. E, no dia 21 de novembro do mesmo ano, Montenegro baixa o decreto nº 1405, contemplando a reforma técnica e administrativa do instituto.

A ordem religiosa escolhida para administrar a instituição foi a das Filhas de Santana, por sua experiência e bom trabalho já desenvolvido no Orfanato Antônio Lemos. Em 16 de novembro de 1905, o contrato foi assinado por Sóror Pierina Della Valle, Provincial da Congregação de Santana, para a prestação de serviço de doze irmãs, junto ao Instituto Gentil Bittencourt. As cláusulas do contrato eram bem definidas quanto às obrigações e responsabilidades das religiosas, e estabeleciam também sua subordinação ao regulamento e orientações baixados pelo Secretário de Estado da Instrução Pública.
Em 20 de junho de 1906, finalmente, o novo prédio do Instituto Gentil Bittencourt é inaugurado pelo governador Augusto Montenegro, para atender duzentas educandas, podendo ser esse número ampliado, de acordo com a necessidade.

O prédio: Bela instituição, majestoso edifício, brilhante legado, caprichosa instalação, belo palácio, são, entre tantos outros, os elogios dedicados à beleza arquitetônica do Instituto Gentil Bittencourt, a merecer destaque nos relatórios do governo, nas revistas de ensino, nos periódicos locais. E representava para a cidade um sinal da modernidade, compatível com o projeto de Montenegro e de Antonio Lemos, de embelezamento do espaço urbano de Belém.
A edificação é realmente suntuosa, ocupando uma área de 3.940 metros quadrados, em forma de “E”, com vistosa fachada, escadaria em mármore de Carrara e um grande jardim em frente. Na entrada principal, que se abre para um terraço, há uma portaria, a sala de recepção, a secretaria, a capela e uma sala de costura. Possui duas alas laterais com dois pavimentos, cujo pé direito mede de 6,30 a sete metros de altura, e um porão que serve de base para o prédio. Nas alas do térreo encontram-se amplas instalações, com grandes salas de aula, refeitório, enfermaria, farmácia, compartimento com mais de trinta banheiros, salas de banho comum, banho quente e com duchas, cômodos para latrinas e sentinas, salão de rouparia e cômodo para roupas, pátios para recreação, lavanderia, despensa, copa e cozinha, uma sala de refeições das freiras e, nos fundos do terreno, a horta.
O segundo pavimento do prédio também possui duas alas, e nelas ficavam o quarto das freiras, quatro pequenos cômodos, duas privadas, quatro amplos e ventilados dormitórios para as educandas e 92 lavatórios.
Todas as alas têm comunicação entre si e com o prédio principal através de galerias, e com os pátios, através de escadas.

No acabamento do prédio, destaque para alguns materiais empregados, como o mármore da capela e das escadarias; os mosaicos e azulejos dos banheiros, cozinha, refeitório e galerias; e o assoalho de madeiras nobres da Amazônia nos pisos das salas.
Alguns desses materiais foram importados da Europa e dos Estados Unidos da América, porém boa parte da mobília foi fornecida pelo Instituto Lauro Sodré.
Os cuidados com a higienização do prédio incluíam o fornecimento de água de boa qualidade, além da instalação de filtros, lavabos, banheiros, latrinas com sifão e tratamento de esgotos.
A preocupação com o problema da higiene, tão criticado nos espaços anteriores do colégio, e os amplos e numerosos espaços construídos parecem revelar a materialização da ideia republicana, configurada num projeto civilizatório de sociedade, no qual a higienização era uma das suas formas mais expressivas.

De modo geral e de outro ponto de vista, poderíamos dizer que a estrutura do prédio estava adequada a uma arquitetura panóptica, com corredores largos, muitas janelas e escadas que, no conjunto, dão visibilidade para as atividades de outros andares e para a área de recreação, permitindo às irmãs observar o que acontecia. O espaço propiciava a vigilância e o controle feito por elas em relação a cada atividade das meninas. Ou seja, isso a que
Foucault chamou de panoptismo, com base nas ideias de Jeremy Bentham, como a possibilidade de observação total das atividades do observado, fazia parte do projeto realizado. E obedecia ao modelo que várias instituições irão adotar por todo o Brasil, nas quais o olhar vigilante garante a ordem.

No Brasil republicano, as instituições para a infância desvalida gradativamente ganham também outros significados, além de referências de espaços, de cuidado e acolhimento, e se fortalecem e se organizam como instituições educacionais. Percebe-se isso, inclusive, para além da atenção dada ao prédio e instalação de objetos e mobília, nas expressões simbólicas como as que encontramos no colégio. É o caso de uma lápide comemorativa feita em mármore, na entrada principal, que conta de forma sintetizada a história do instituto, relatando datas e fatos importantes, desde sua criação em 1804 até a inauguração do novo prédio em 1906. E é o caso também do monumento em mármore no jardim à entrada, simbolizando a educação vista como caridade, salvação e futuro das crianças e remédio para todos os males, cujo significado é assim descrito por Vianna:

Sobre um embasamento arquitetural que se apóia em três degraus e que surge entre flores e folhagens, vê-se uma formosa mulher – a instrução pública – indicando a uma criança do povo o Instituto Gentil Bittencourt, onde lhe reservam educação e amparo. O aspecto da criança é de sofrimento e indigência: ela se arrima à grande imagem tutelar, símbolo de toda a civilização humana, como para invocar nesse abandono a graça do seu magnânimo e carinhoso acolhimento. Sôbre os degraus e perto das flôres, no plano mesmo do terreno, duas educandas, com as vestimentas próprias e regulamentares, juvenis e álacres, levam uma coroa de flores e louros como tributo de seu agradecimento pela educação recebida.
Fonte: Celita Maria Paes de Sousa.

Histórico do município: A história da cidade de Belém confunde-se com a própria história do Pará através de quatro séculos de formação e desenvolvimento.
Coube a Francisco Caldeira Castelo Branco, antigo Capitão-Mor do Rio Grande do Norte, um dos heróis da expulsão dos franceses do Maranhão, a honra de comandar uma expedição de 200 homens com o objetivo de afastar do litoral norte os corsários estrangeiros e iniciar a colonização do ‘Império das Amazonas’.
Em 12 de janeiro de 1616, a cidade de Belém foi fundada por Francisco Caldeira Castelo Branco. Lançou os alicerces da cidade no lugar hoje chamado de Forte do Castelo. Ali edificou um forte de paliçada, em quadrilátero feito de taipa de pilão e guarnecido de cestões. Essa fortificação teve inicialmente o nome de Presépio, hoje o histórico Forte do Castelo. Em seu interior, foi construída uma capela, sendo consagrada a Nossa Senhora da Graça. Ao redor do forte começou a formar-se o povoado, que recebeu então a denominação de Feliz Lusitânia, sob a invocação de Nossa Senhora de Belém.
Nesse período ocorreram guerras, em decorrência do processo de colonização através da escravização das tribos indígenas Tupinambás e Pacajás e da invasão dos holandeses, ingleses e franceses. Vencidas as lutas com os invasores, a cidade perdera a denominação de Feliz Lusitânia, passando a ser Nossa Senhora de Belém do Grão Pará.
Em 1650, as primeiras ruas foram abertas, todas paralelas ao rio. Os caminhos transversais levavam ao interior. Era maior o desenvolvimento para o lado Norte, onde os colonos levantaram as suas casas de taipa, dando começo à construção do bairro chamado de Cidade Velha. Na parte sul, os primeiros habitantes foram os religiosos capuchos de Santo Antonio.
Em 1676, chegaram, da ilha dos Açores, 50 famílias de agricultores, no total de 234 pessoas. Nessa época, destaca-se a construção da Fortaleza da Barra e do Forte de São Pedro Nolasco.
No século dezoito, a cidade começou a avançar para a mata, ganhando distância do litoral. Belém constituía-se não apenas como ponto de defesa, mas também centro de penetração do interior e de conquista do Amazonas.
A abertura dos rios Amazonas, Tocantins, Tapajós, Madeira e Negro para a navegação dos navios mercantes de todas as nações, no século XIX, após o período colonial, contribuiu para o desenvolvimento da capital paraense.
No início do século XX, ocorreu grande avanço na cidade de Belém, porém a crise do ciclo da borracha e a I Guerra Mundial influenciaram a queda desse processo de desenvolvimento.
Fonte: IBGE.

FOTOS:

MAIS INFORMAÇÕES:
Celita Maria Paes de Sousa
Site da instituição


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